31 julho 2008

O Papel dos Pais e Encarregados de Educação na Corrupção no Ensino em Moçambique!

O que vou escrever nas linhas a seguir, é baseado na minha experiência escolar e reflecte a minha visão sobre o que considero ser, a génese da corrupção no ensino, não só no (meu) contexto particular, mas que com certeza espelhará realidades similares doutros cantos desta nação Moçambicana!

Ao contrário do que possa parecer, a corrupção no ensino não foi iniciada pelos professores. Esse fenómeno foi inteiramente inventado, promovido e posteriormente sustentado pelos pais e encarregados de educação (normalmente dos mais abastados, tipo directores de empresas, homens de negócios, chefe daqui/dali, etc).
Nos meados da década de 80 e no periodo imediatamente antes da “reabilitação económica”, estava eu ainda na escola primária, e comecei a observar um novo fenómeno. Alguns pais comecaram a criar um tipo de relação “particular” com os professores. Tudo começava por uma “merenda especial” para o professor trazida pelos seus filhos e cedo começou a observar-se uma separação distinta: os que traziam lanche para o professor e os que, devido as suas parcas condições, não se poderiam dar a esse luxo. Depois era conversa aqui, conversa ali, professor convidado para casa deste e para casa daquele! Algum tempo depois, o professor se encontrava na condição de “completamente alienado” pelos encarregados de educação “que podiam”. É nesse ambiente de “promiscuidade” que começou a surgir a prática de “Explicações” (aulas privadas remuneradas). Estas eram geralmente ministradas na casa do aluno “mais rico” (que poderia albergar confortavelmente mais gente) e tinhamos relatos que o professor não só era bem pago, como de vez em quando, voltava a casa com uma “cesta básica” bem recheda (os tempos eram dificeis e açucar, pão, etc eram alimentos de luxo).

Eu provenho duma familia com longa história de professorado e, conforme minha mãe me disse, no tempo colonial, aulas particulares (remuneradas) eram permitidas mas nunca a seus próprios alunos (por razões mais do que óbvias).

Quando esta prática começou a entrar em “proliferação”, uma das grandes falhas do nosso Ministério de Educação foi a de não regulamentá-la. Acredito que o “câncro” do nosso sistema de educação iniciou mesmo ai e vou explicar porquê:
Quando o professor começa a dar “Explicações”, a sua presença na sala de aulas, para a maioria deles, passa a ser a de criar um ambiente propício para que mais gente adira às aulas particulares. Faz isso despachando as aulas e, em contrapartida, ensinando tudo até ao menor detalhe nas “aulas de explicação”. Quase sempre, esses professores não se coibem de (pretender) mostrar que os seus alunos “queridos” estejam melhor preparados que o resto dos “pobres coitados”. Fá-lo através de perguntas previamente elaboradas e estudadas no seu “ambiente privado”. Outra corruptela importante é inclusive, a preparação dos seus alunos particulares antes das avaliações, com amostras muitas das vezes “totais e completas” dos testes oficiais.
Portanto, as “aulas de explicação” e volto a repetir, inventadas, promovidas e suportadas plenamente pelos encarregados de educação nada escrupulosos (ou se calhar, “bem escrupulosos”) surgem como um meio de assegurar a passagem dos seus educandos e nunca, como um meio de garantir uma aprendizagem consistente. Prova disso é o facto de “nunca” nenhum deles (aqui falo da maioria) se interessar em arranjar para os seus filhos, um “explicador” que não fosse o próprio professor da disciplina.
Recordando parte dos meus ex-colegas, a sua preocupação no primeiro dia do ano lectivo era de saber quem eram os professores que davam “explicações”, mesmo antes de ter tido uma aula sequer. E se a disciplina não fosse “famosa” havia que “convencer” o professor a dar “aulas de explicação”! Foi assim desde a primária até ao ensino pré-universitario.
Os estudantes “sem posses” e cujos encarregados não tem possibilidade de pagar pelas “explicações” ao longo do ano e, consequentemente, sentem a “hostilidade da sala de aulas” reflectida nas suas “baixas” notas, acabam recorrendo aos “pagamentos” ilicitos do fim do ano lectivo (relativamente muito mais baixos que o valor global dispendido nas explicações) para garantir a sua passagem de classe. Se se fizesse um inquérito nacional, tenho a certeza que muito poucos encarregados (principalmente nos centros urbanos) estariam em condições morais de afirmar que nunca se envolveram nessa prática ou nunca disponibilizaram dinheiro aos seus educandos para “resolverem” esse tipo de “problemas”. É preciso notar que, não poucas vezes, os estudantes visados nem sempre sejam “maus alunos”, mas “vitimas” desses professores desonestos que criam um cenário “impossivel” de passagem de classe ou porque querem dinheiro ou porque querem alguns “favores sexuais” daquela garota gira que “não me pode escapar”! São nossas filhas, nossas irmãs, esperanças desta nação que deveria crescer com valores morais e respeito próprio e mútuos que, acabam “vitimas” desta escumalha de abutres que, em circunstância ou lugar algum se deveria envolver neste tipo de práticas.

Mas é exactamente isto que me revolta: “A incapacidade do moçambicano exercer o seu direito à indignação, denunciar e repudiar de forma veemente este tipo de práticas”. Apesar de ser comum a existência de “comissões de pais” nas nossas escolas, nunca nenhum professor é chamado a “justiça”. Todo o mundo teme “represálias” e possiveis “reprovações” sistemáticas dos seus educandos. Mas esquecemos o efeito que a união de duas ou mais vitimas pode causar a esses prevericadores, fazer as suas vozes serem ouvidas mais longe e acabar com essa vergonha em cada escola deste território! Cada pai e encarregado de educação deve instruir o seu educando (filho ou filha) a comunicá-lo, sempre que algum professor pretenda pôr em prática uma destas ilegalidades e a atitude não deve ser de “condescendência” mas de “denúncia” e sem contemplações.

E voltando aos “meninos da explicação” e porque a justiça pode tardar, mas sempre chega, muitos deles conotados como “bons estudantes” ao longo dos anos, nunca conseguiram passar ao exame de admissão a universidade ou apenas o conseguiram após repeti-lo sistematicamente noutros tantos (longos) anos!

24 julho 2008

Tomando um “copito” com o Ministro da Educação!


“Education is our only way out of darkness”
Forester Whitaker in The Great Debaters

Esta vai ser uma conversa animada (espero) com um dos ministros mais “smart” aqui da “pérola”. E a comida e a bebida tem que condizer com a ocasião!! Um (peixe) “pende” lá de Metangula bem grelhado e uma boa cerveja, não será má ideia! Mas não vamos beber Heineken, Excia! Será a “nossa” 2M à pressão, não só para valorizarmos o que é nosso, mas também, para darmos o exemplo de “austeridade” que tanto se tem propalado ultimamente!

Percebo e concordo plenamente que, uma das prioridades do seu mandato se centre no aumento do número de escolarizados e, consequente redução do indice de analfabetismo nesta “pérola”.

Moçambique apresenta taxas de analfabetismo superiores à média da região sub-sahariana. Segundo dados estatísticos recentemente publicados pelo Instituto Nacional de Estatística a taxa média de analfabetismo entre a população adulta do país situa-se à volta de 53.6%, sendo mais elevada nas zonas rurais (65.7%) do que urbanas (30.3%) e mais saliente nas mulheres (68%) do que nos homens (36.7%). O sistema formal de ensino não consegue absorver todas as crianças em idade escolar, deixando de fora cerca de 50% delas, o que constitui uma fonte permanente de crescimento da população analfabeta no país. Segundo a mesma fonte, o n° de Alunos Matriculados e Escolas por Nível de Ensino Público no ano de 2003, consta da tabela acima indicada.

É possivel ver com clareza que há aqui um problema crasso de (falta de) “progressão/continuidade” no ensino, o que em minha opinião se deve fundamentalmente à falta de unidades escolares (e professores) junto a população. Muito poucos pais tem recursos para transferir seus filhos da localidade ou vila, para a sede distrital ou para a capital provincial, onde sem sombra de dúvidas a maior parte das unidades escolares acima indicadas se encontra.

No entanto, fico perplexo quando vejo noticias como “esta”, em que o MINED dispõe de 72 milhões de USD para novas construções (6000 salas por ano), mas os progressos até aqui verificados são extremamente baixos por falta de “capacidade técnica”(??). O que significa exactamente esse conceito de "capacidade técnica"?? Atendendo que o Ministério dispõe do GEPE (Gabinete de Estudos e Projectos de Educação) inclusive representado nas três regiões e que, todas as provincias dispõem de Direcções de Obras Públicas e Habitação para zelar por tudo o que se refira a investimento público em Infraestruturas e, numa altura em que todo o empreiteiro que conheço nos vários cantos deste pais lamenta pela falta de trabalho (obras), estará Excia querendo ter seus próprios “pedreiros” para expandir a rede escolar?? Porque é que os concursos não são lançados por essas instituições (principalmente as DPOPH) que estão vocacionadas para o efeito ou invés de pretender criar novos organismos? Se o volume de trabalho é enorme, porquê não envolver empresas nacionais de consultoria para fiscalizarem as obras?

Ou trata-se de um “jogo de contenção” para legitimar a sua actual estratégia de que, os altos indices de analfabetismo derivam das baixas taxas de aprovação e que portanto, “tudo” mundo deve passar compulsivamente! Excia por acaso já se deu ao tempo de observar como e o quê os nossos estudantes do secundário (e não só) escrevem? Eu tenho visto as provas dos alunos da minha esposa e a situação Excia, é de bradar os Céus!! Lamentavelmente e, conforme ela me tem dito, as “ordens” da Direcção da escola nos “conselhos de nota” são bem explicitas: “Passar, passar, passar (no matter what) ! Não queremos problemas com a Direcção de Educação!!”
Será que são mesmo suas ordens Excia?? Ou conforme ouvimos em todas as esquinas que se trata de mais uma “imposição dos doadores”?? Excia quer mesmo carregar o fardo de “homem que destruiu o sistema de educação Moçambicano”?
Se nós não conseguirmos formar os nossos futuros quadros com qualidade e incuti-los (durante o processo) o principio de sacrificio e de superação, de que nos valerá referir daqui há alguns anos de que “não temos analfabetos”, se esses individuos não tiverem a capacidade, visão e análise necessárias para tirar este pais do marasmo em que se encontra?? Custa ver que essa não passa (e se for o caso) de mais uma “receita envenenada” (outros exemplos não faltam) para nos dar morte lenta e aniquilar por completo as esperanças desta nação??

Pretende Excia (ou tá pouco se lixando) que daqui há 100 anos continuemos a ter dirigentes que, em acordos que em nada beneficiem o pais, venham a público dizer que “estão a cumprir as imposições dos doadores” e, com a cara lavada, achar que estejam a fazer uma governação de excelência??

Pais algum que logrou atingir desenvolvimento, se deu ao luxo de andar a brincar aos “piqueniques” com o sector de educação! Este é um sector crucial e é imperativo que, antes da obsessão pelos números, se assegure que cada homem formado tenha a qualidade necessária e esteja preparado para os desafios que se lhe impõem! Essa é que é a missão da Educação!!

Excia, este “papo” criou-me cá uma azia, que não encontro estômago para a sobremesa!!

19 julho 2008

Cada um à sua medida!

Enquanto uns celebram as centenas de milhar, o “Desenvolver Moçambique” atingiu hoje as suas primeiras 1000 visitas! Todos gostamos de números “redondos” e achamos que eles carregam consigo, algo de especial, e nós aqui não vamos fugir à regra!
O “Desenvolver Moçambique”, com o seu estilo literário caracteristico, que eu apelido de “cocktail Molotov”, está ainda na sua fase inicial e pretende no seu dia a dia, com ironia, humor, simplicidade e discurso directo, não só abordar assuntos cruciais e “criticar” as mazelas que vão ocorrendo cá entre nós, mas e sobretudo, avançar com soluções alternativas para a sua mitigação.
Por isso, quero agradecer em nome do "Blog" a todos os seus leitores nos quatro cantos do mundo, pelas suas visitas e contribuição em ideias, para que todos juntos façamos de Moçambique, a nação formidável que tanto ansiamos e pretendemos construir!

16 julho 2008

Tomando um “copito” com o Ministro da Agricultura!

Sou daqueles que acha que num país com políticas multi-sectoriais de desenvolvimento “claras” e planos estratégicos bem delineados, qualquer um, independentemente da sua área de formação, mas que reuna atributos de competência, liderança e gestão, pode dirigir seja qual for o Ministério. Quando esses pressupostos não são observados e num universo de meia centena de ministros e seus vices apenas verificamos entre nós, meia duzia a exercer funções nas suas respectivas áreas de formação, três cenários infalivelmente acabam ocorrendo:
- O ministro fica “refém” dos seus assessores (costuma haver uma batalha aguerrida para se ser o “mais querido”) e estes é que definem a agenda;
- O ministro não quer dar o braço a torcer e não deixa o leme em mãos alheias. Os seus súbditos deixam-no “queimar-se”, e são falcatruas atrás de falcatruas……
- O ministro não faz e não deixa fazer, para não se “queimar” e manter a pele intacta!
Seja qual for o cenário Excia, sugiro que nesta refeição tenhamos álcool forte! Não venha uma (eventual) mágoa querer flutuar….é para se afogarem de verdade! Como Excia já esteve em Manica, proponho uma “cabeça do velho”. Porque “revolução verde” tem sido a palavra de ordem, deveriamos ter tudo verde nesta mesa, incluindo toalhas e guardanapos (e já agora, o garçom também)! Mas como isso não se afigura nada fácil, sugiro uma mathapa com caranguejo e uma xima!

Passam já 33 anos de independência e 16 em plena paz, mas ainda não conseguimos ser auto-suficientes em tomate ou limão. Isso é preocupante, Excia! Ouvimos gritos de alegria e as maiores exaltações porque temos um projecto “piloto” a cultivar batata-reno na Moamba, ou um projecto “piloto” a iniciar o cultivo de trigo em Manica e Tete, ou porque foi assinado um acordo com a Universidade de Delft para a criação de um projecto “piloto” de tecnologias de aproveitamento de água na “aldeia do milénio” em Chibuto! Até quando vamos viver de projectos-piloto, Excia? Até quando, estas acções isoladas e que nunca tem progresso?
Pessoalmente, fico feliz quando ouço falar de iniciativas destas, mas pergunto-me: qual a sua consequência? Qual é o plano sectorial, qual a estratégia de acção para reconduzir Moçambique aos altos patamares de produção (mundial) outrora alcançados? Cadê o plano mobilizador para elevar o mais alto espirito de sacrificio e entrega abnegada deste povo ao trabalho? Basta pedirmos as populações para elevarem a sua “auto-estima”, aumentarem a “produção” e a “produtividade”? Alguma das nossas mamanas lá em Nametil ou Massangena, percebe esse vernáculo?
Se olharmos para as nações que lograram atingir altos niveis de progresso agricola, os seus governos tiveram e continuam a ter um papel preponderante em todo o processo! Duas áreas fundamentais da sua acção se referem a “formação” (agrónomos e técnicos agrários a apoiar os agricultores no terreno) e “investimento” em infraestruturas (regadios, fontes de captação e retenção de água como barragens ou mesmo represas de terra, como referi anteriormente aqui) e sementes melhoradas.
O Ministério da Agricultura tem que sair da capital e ter o seu polo de acção instalado lá no campo, junto ao agricultor que continua a queimar o capim “como os meus antepassados sempre fizeram”, degradando o solo. As viaturas 4x4 que continuam a ser anualmente alienadas aos srs. Directores nacionais e que pela sua quantidade per capita, andam parqueadas, devem ser enviadas lá para o distrito para servir aos extensionistas.
Fala-se sempre em muitos milhões de dólares necessários para a aquisição de equipamento agricola, mas são essas acções “simples” e com tecnologia acessivel que vão gradualmente conferindo know-how e competência aos agricultores que, melhorando a sua produção, produtividade e consequentes rendimentos, os capacitarão a ir adquirindo maquinaria que, logo a partida, se afigura extremamente onerosa. Pensamos erradamente, que o farmeiro lá na África do Sul inicia a sua actividade com a aquisição de um tractor multi-funções, o que de longe corresponde a verdade!
O sector agricola não se vai desenvolver por si só, como os “doadores” e proponentes do “free-market” gostam de apregoar e nos impor! Não foi assim como o sector evoluiu nos seus paises. Esqueça isso Excia! Blá blá nos comicios as populações e o agora na moda, “lobby” dos biocombustiveis no Conselho de Ministros (“Procana” em Massingir; “Mozambique Principle Energy” em Sussundenga, etc) também nada irá alterar a situação alimentar do pais e continuaremos a depender aqui do vizinho. Com a crise alimentar actual com sinais cada vez mais alarmantes e se de repente, os nossos “compadres” aqui do lado (que não se custam nada irritar) “inventarem” uma guerra “horticulofóbica” em que camiões com tomate e repolho comecem a ser impedidos de atravessar a fronteira porque os de cá “não sabem produzir”, o que faremos, Excia??
So para comprovar até onde vai a nossa (in)dependência, peça Excia, já que eles têm fruta da época, a nossa sobremesa. Seja o que for, laranja, maçã, banana, pêra, etc, verá que tudo será infalivelmente aqui do “vizinho”!
E eu que cresci comendo aqueles pêssegos deliciosos de Angónia………… Não há ainda um projecto-“piloto” para reactivar a sua produção, Excia??

E falando em “revolução verde”, será que nos corredores do nosso MINAG ouve-se por acaso falar da pessoa de Norman Borlaug, ou não passará ele de um E.T?