Inicio esta reflexão recorrendo a um excerto de uma série que tenho estado a conduzir, relacionada à “Corrupção na Construção Civil em Moçambique”, e redigido na primeira semana deste ano:
[Ora, e aqui no burgo, já alguém tentou avaliar os múltiplos apartamentos, moradias, carros e contas bancárias de “carapaus-médios” e seus familiares directos, para encontrar congruência entre o que estes nossos “funcionários públicos” auferem e os bens que possuem?? Naturalmente que esta tarefa fica complicada, quando a classe governante neste país insiste que “roubar impunemente bens públicos” se enquadra no conjunto de “valores e princípios moçambicanos a preservar”!! Prova disso é o pacote da “Lei Anti-Corrupção” que deveria também salvaguardar estas matérias e pôr estes “carapaus-médios” e todos os outros “ladrões compulsivos” em linha, mas que está a apodrecer lá nas gavetas da “Malígna Assembleia”!! Dizem que não aprovaram ainda por falta de tempo, mas estamos aqui sentados a espera, para ver o que acontece neste 2012].
Para os Moçambicanos que têm minimamente acompanhado a realidade política Africana, tem sido recorrente notar as posições cimeiras alcançadas por países como Cabo-Verde, Botswana, Namíbia, etc, em tudo quanto seja índices de desenvolvimento, democracia, governação, percepção de corrupção, entre outros, ao mesmo tempo que vemos o nosso país sucumbir em posições atentatórias ao orgulho nacional. Mas, a verdade é que dificilmente paramos para avaliar “os porquês” do nosso constante fracasso e do sucesso alheio.
Cada país escolhe os “valores e princípios” por que se pretende reger. Provavelmente, no contexto actual, estas duas sejam as palavras menos utilizadas no nosso discurso político, e falo aqui exactamente do governo-do-dia e seus tentáculos. Evita-se mencionar estas palavras talvez por falta de uma “definição” do que devam ser os valores nobres a defender pelos Moçambicanos ou, o que parece pesar mais, uma cultura e acção política desprovidas de algo que se assemelhe ou se ouse associar a “valores ou princípios”. Naturalmente que causa vergonha fazer menção a eles, quando se tem noção que não existem, porque vivemos hoje numa era em que os discursos precisam de ser sustentados pela prática quotidiana.
A UTREL - Unidade Técnica da Reforma Legal, comandada pelo Dr. Abdul Carimo conduziu um trabalho aturado, ao longo de vários anos, colhendo as mais diversas sensibilidades, académicas, jurídico-legais, etc, para reformar a nossa Administração Pública e Magistratura Judicial. Estamos a falar de leis obsoletas, nunca alteradas em séculos seguidos, ou de leis novas que foram propostas por este Organismo e que estão em consonância com os padrões de qualquer país moderno e civilizado. Entre estas se incluem: revisão da lei dos desvios de fundos do Estado; código de ética do servidor público; revisão do Código Penal; alteração ao Código do Processo Penal; e a proposta de lei de protecção de vítimas, denunciantes e outros sujeitos processuais.
O que está aqui em jogo não é um mero “Pacote da Lei Anti-Corrupção”, mas o tipo de país que os Moçambicanos querem, os valores e princípios por que se deve reger esta Nação, sabido que a conduta dos governantes se reflecte pelo “efeito cascata” no comportamento dos cidadãos. O debate em curso já mostrou com clareza o que esta Sociedade quer. Qualquer político maduro deveria ter capacidade suficiente para medir essa pulsação. Porque ao fim do dia, os Governos desta vida metem-se em sarilhos (e acabam perdendo o poder) por, na sua casmurrice habitual, insistir em avançar numa direcção oposta àquela imposta pelos seus “contratantes”. Não devia haver dúvidas sobre a “natureza contratual” do pacto entre a Sociedade e os Governantes ou quem é “Contratante” e quem é “Contratado” nessa relação.
Mas é preciso fazermos aqui uma retrospectiva histórica!! Quando o pacote que inclui o novo Código Penal e a Lei Anti-Corrupção foi submetido à Assembleia da República no ano passado, o que aconteceu?? Vimos a bancada maioritária (a tal que tem medo de palavras como “princípios” e “valores”) pretender esquartejar o pacote legislativo, para de seguida escolher as porções que menos comichão lhes causava nas orelhas. O pânico inicial permitiu revelar o que, de facto, vai na mente desta gente!! Naquela altura, não se falava de “falta de tempo” ou de “necessidade de consultar os académicos e blá, blá”. Gorada essa tentativa, a estratégia a seguir foi “deixar arrefecer o pato” e, quando já se estava na última sessão do ano, todas as iniciativas da Oposição em levar o pacote à discussão foram sabotadas. No fim do ano passado, o que diziam incessantemente era “não debatemos por falta de tempo”, “a agenda estava muito preenchida”, “não estamos a protelar o debate” (lá em Mugeba entendeu-se “prateleirar” – pôr na prateleira).
Iniciada a primeira sessão deste 2012, o Pacote da Lei Anti-Corrupção foi inequivocamente pontapeado para fora da Assembleia da República. “Não vai ser debatido este ano”!! Os argumentos, como as larvas, esses se metamorfoseiam a uma velocidade estonteante!! “Agora temos que consultar os académicos”!! Quer dizer, no curto espaço das férias do fim do ano, as razões para o “não-debate” mudaram drasticamente!! É preciso ver que já no longínquo ano de 2009, a UTREL já estava a trabalhar nestas matérias. Esta não é uma “organização de mukheristas”!! Estão lá juristas de carreira, e um trabalho desta envergadura não se realiza sem auscultar as mais diversas sensibilidades!! “Benefício da dúvida” pode se dar uma vez!! Agora, quando de forma recorrente, vemos o mesmo episódio desenrolar-se por duas vezes, três vezes,….huumm.....aí não deve haver dúvidas que estamos em presença de uma “trapaça das grandes”!!!
A Assembleia da República é um “Órgão Legislativo”!! Pagamos aqueles 250 senhores e senhoras para produzir leis. Este não é o caso!! As leis estão feitas por profissionais da área e o que se pede aos senhores deputados é debatê-las e aprová-las ou rejeitá-las, conforme as convicções dos que dizem lá estar para defender os interesses do Povo!! Agora, as leis ainda não foram tocadas, não foram debatidas e tenho certeza que grande maioria dos deputados nem sequer as terá lido, informalmente que fosse!! Como é que nessas circunstâncias se vai procurar “aconselhamento externo”??
É como se se servisse um “pato grelhado” a uma família esfomeada (e há muita fome na Assembleia da República) e os membros desse agregado ficassem a dar voltas à mesa, franzindo a testa, esfregando as mãos e torcendo seus narizes, enquanto se embrulhavam em discussões teóricas “se o pato era mudo ou marreco”!! E, a meio dessa zaragata, decidissem sair porta-à-fora com a travessa, a procura de um “Consultor-Culinário” para lhes satisfazer a “dúvida”!!
“Mas Jóh, porquê não trincham o bípede palmide e começam a vossa discussão a sério sobre quem de facto conhece patos”???
Até onde a bancada maioritária pretende levar esta sua peça teatral: “O Pato Grelhado”??
Conforme dizia acima, governos sérios procuram não estar à leste do que as suas Sociedades querem!! E aqui, não deve haver equívocos!! O tempo de governantes empatando múltiplos empregos, sem nada fazer e indo apenas receber os seus salários ao fim do mês, quando jovens recém-formados poderiam lá estar a matutar as suas cabeças, para dinamizar as nossas empresas públicas e tirá-las da ociosidade, acabou!!
O tempo de “ladrões compulsivos” no Governo usurpando bens públicos e como medida de punição serem meramente “transferidos para outras pastagens”, acabou!!
O tempo de Governantes camuflados de “servidores públicos”, quando se metem no Estado para apenas administrar e expandir os seus negócios familiares e de sequazes associados, acabou!!
Tem vocação empresarial? Tudo muito bem!! Que venha cá fora e mostre a sua competência!! Está e quer continuar no Estado? Então é para servir, é para pensar o Povo!! Mesmo a fazer os seus check-ups em Nelspruit ou a comer uns camarões na praia do Wimbe com a sua família, é o Povo que deve girar na sua massa cinzenta!!
O país que queremos é esse!! E, quando digo “acabou”, estou a referir-me “a bem ou a mal”!!! Esse é o curso normal deste tipo de coisas....!!!
Se a classe actualmente governante entende de outra maneira, que se deixe de joguinhos e ao menos tenha elevação e coragem suficientes para vir cá a terreiro defender os seus pergaminhos!!
Que digam abertamente que “o roubo impune de bens públicos” se enquadra no conjunto de “valores e princípios que a Frelimo quer preservar”!!
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